Agulha de Huber: uma pequena angulação que faz total diferença na preservação do port-a-cath

Imagem da ponta da agulha de Huber angulada protege o septo de silicone de 'coring'

Ontem, eu estava terminando a colocação de um port-a-cath com um residente. O paciente iniciaria a quimioterapia logo após o procedimento, ou seja, já deixaríamos o port puncionado. Foi então que a instrumentadora, nova na equipe, pediu uma agulha convencional de punção venosa.

Para quem não está familiarizado com o port-a-cath (também conhecido como port, portacath e portocath), a punção deve ser feita com uma agulha específica: agulha de Huber. Apesar de muito comum em centros oncológicos, muitas vezes não se entende totalmente o porquê do seu formato. Vamos entender tudo por trás dessa agulha curiosa, que à primeira vista parece apenas uma agulha torta.

Pouca gente sabe, mas a agulha de Huber foi inventada por um dentista chamado Ralph Huber e patenteada em 1946. A ideia original era prevenir o coring — quando um fragmento de tecido é arrancado durante a punção — e também minimizar a dor.

O port-a-cath (saiba mais sobre port-a-cath aqui) é composto por um cateter, geralmente de silicone, que leva a medicação diretamente à corrente sanguínea. Ele também possui um reservatório com uma membrana de septo de silicone, que é puncionada pela agulha de Huber. Essa punção precisa ser feita corretamente para garantir a manutenção do dispositivo e evitar complicações.

Embora seja muito utilizado para quimioterapia, vale lembrar que seu uso se estende também à administração de antibióticos, retirada de amostras para exames de sangue e até mesmo à infusão de contrastes endovenosos.

A principal função da angulação da agulha é realizar apenas um corte perpendicular ao tecido — ou a um dispositivo — como mostrado na imagem abaixo. Essa engenharia simples, que evita um corte circular, acabou servindo perfeitamente para o propósito de punção segura e repetida do port-a-cath.

Imagem da ponta da agulha de Huber angulada protege o septo de silicone de 'coring'

A agulha de Huber possui diferentes comprimentos, o que faz bastante diferença na hora da punção, dependendo se o port está mais superficial ou profundo. Ela pode ser totalmente reta — formato usado com frequência logo após a implantação do port-a-cath, antes do fechamento da pele, para testar o dispositivo — ou angulada, como nas punções realizadas durante a quimioterapia. Também há variações no diâmetro da agulha, que devem ser ajustadas conforme o tipo de medicação, levando em conta a viscosidade do medicamento e se o paciente é adulto ou criança.

Em média, o port-a-cath pode ser utilizado por até cinco anos, sendo puncionado diversas vezes nesse período. Por isso, o uso da agulha correta — que minimiza o coring e o desgaste do septo — é essencial para garantir sua durabilidade e segurança. A integridade do septo de silicone também é fundamental para prevenir vazamentos de medicação, que podem expor o paciente ao risco de infecção ou a efeitos locais agressivos do fármaco.

Uma equipe composta por médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde é fundamental. Desde a preparação para a punção, com técnica rigorosa de antissepsia e assepsia, até os cuidados de manutenção, é preciso ter em mente que a infecção está entre as principais complicações do port-a-cath. O treinamento para punções precisas, a realização de curativos eficientes e a preservação da pele ao redor do acesso também fazem parte dos cuidados que garantem a segurança e a durabilidade do dispositivo.

É essencial escolher a agulha de Huber com as características adequadas — comprimento e diâmetro — de acordo com o paciente e o tipo de medicação a ser administrada. A equipe também deve estar treinada para reconhecer as complicações mais comuns relacionadas à punção do port-a-cath. A identificação rápida de infiltrações é essencial, já que quimioterápicos podem causar danos severos ao tecido em caso de extravasamento. É igualmente importante saber reconhecer disfunções no port e entender como manuseá-las e corrigi-las. Além disso, estar atento aos sinais de infecção permite um tratamento imediato e pode evitar complicações graves.

O hospital também precisa contar com protocolos claros de manutenção, como a indicação do uso de soluções salinas ou heparinizadas. Deve haver orientações sobre o uso (ou não) de antibióticos relacionados à colocação do port-a-cath. Essas orientações devem se estender ao paciente, que precisa saber como se portar com o port puncionado: identificar sinais de infecção, evitar situações que possam deslocar a agulha e saber inspecionar o curativo, verificando se está em bom estado.

Enfim, não basta apenas contar com um material de qualidade. É essencial que toda a equipe médica e de enfermagem esteja bem treinada para realizar a punção do port-a-cath de forma precisa, limpa e segura.